Ele tem apenas 25 anos, mas já faz parte da história de um gigante azul de mais de meio século. É bem provável que Marcelo Grohe seja o último goleiro a atuar no Olímpico. E o primeiro a jogar na Arena, nova casa do clube.
Essa "sorte" de estar no lugar certo e na hora certa pode ser, na verdade, entendida como uma recompensa pela insistência. Grohe chegou ao Grêmio com apenas 13 anos e é o atleta com mais tempo de clube no atual elenco. Ninguém conhece o Olímpico como o camisa 1.
- Para mim, ainda é uma sensação estranha pensar que tudo isso vai ser demolido. Passei quase metade da minha vida aqui dentro. É uma rotina que vai mudar - pondera, entre a melancolia e a expectativa.
A convite do GLOBOESPORTE.COM, Marcelo Grohe retornou aos lugares mais marcantes de sua vida no Olímpico. Corredores, vestiários, campos e refeitório - tudo leva o goleiro à alguma recordação. Em sua mente, o estádio jamais virará pó.
Natural de Campo Bom, na Região Metropolitana de Porto Alegre, pegava uma van e atravessava 56 km de asfalto até chegar ao estádio. Todo o dia. Ao sair da escola, por volta das 12h, se deslocava até a estrada mais próxima para esperar o transporte. A viagem durava uma hora e trinta minutos. Depois de treinar, mais uma vez, aguardava o motorista para retornar a sua casa. Ou melhor, sua primeira casa, porque o Olímpico já estava se tornando igualmente um lar.
- Eu lembro que a gente comprava salgadinhos e refrigerante de dois litros. Tudo isso para esperar a van em frente ao vestiário. Coisa de moleque mesmo.
Encostado no pilar em que esperava o veículo, Marcelo recorda que, naquela época, quando ainda atuava na equipe sub-13, nem sonhava que ganharia a titularidade anos depois, na temporada de despedida do Olímpico. Conviver com os colegas no estádio parecia mais uma diversão do que a profissão que escolheria para a vida inteira.
- Cara! Esse foi meu primeiro vestiário - dispara, ao entrar no local que antigamente o acolhia.
Os anos passaram, e os funcionários que cuidam do espaço mudaram. Marcelo pede licença. Não precisa. Todos o tratam como um amigo de longa data. As atividades nas categorias de base criaram a forte ligação entre o atleta e a casa tricolor.
Até mesmo os dias de chuva eram motivo de diversão. Deixavam de treinar no Centro de Treinamentos de Eldorado do Sul, na Região Metropolitana, para percorrer os corredores mais remotos do Olímpico.
- Eu lembro que a comissão técnica, quando chovia, mandava a gente correr nos espaços cobertos do estádio. Assim, a gente ia na arquibancada, nos corredores. Era um monte de criança correndo por aqui.
Acostumado a viajar de segunda a sábado de Campo Bom a Porto Alegre, Grohe tomou o Olímpico como segunda morada. Nas oportunidades em que os jogos eram marcados para domingo, pernoitava no estádio. O antigo dormitório não abriga mais os atletas das categorias de base do time, mas as recordações continuam.
- Não foram tantas vezes. Mas eu lembro que não queria voltar na sexta-feira para Campo Bom. Preferia ficar por aqui, porque assim treinávamos no sábado para jogar no domingo.
Fominha, não esquece nem o cardápio
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Marcelo passou também pelo time sub-14, juvenil e júnior. A exigência ficou maior, e os treinos foram estendidos para o turno da manhã. Foi quando Grohe se mudou para Porto Alegre, aos 17 anos. Não poderia escolher outro lugar para viver, que não fosse próximo ao Olímpico. Morava a apenas uma quadra de distância, com mais três amigos. Ia a pé para o estádio. Almoçava e jantava com os companheiros. Até mesmo o cardápio do refeitório está na lembrança do jogador.
- Comíamos sempre feijão, arroz, uma carne e salada. Às vezes, tinha massa. Bebíamos suco e tínhamos direito a pegar uma sobremesa. A porção não éramos nós que escolhíamos. Tinha uma 'tia' que servia.
Seu primeiro jogo como profissional foi em 2006, com o técnico Mano Menezes. Em meio a tantas memórias, fica difícil escolher a defesa mais emblemática. Mas Marcelo se esforça.
- Acredito que um dos jogos mais marcantes foi a minha estreia em Gre-Nal. Sobre a defesa, é complicado falar. Mas escolheria uma cabeçada do Fernandão (atual técnico do Inter) neste primeiro clássico (em 1º de abril de 2006, 0 a 0, primeiro jogo da decisão do Estadual). Havia um nervosismo. A defesa foi um alívio - disse, lembrando que o Grêmio venceria o Gauchão ao empatar por 1 a 1 no confronto da volta, no Beira-Rio.
Demolição do Olímpico é assunto até no Coritiba
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Desde que assumiu definitivamente a titularidade do gol tricolor em 1º de julho, contra o Atlético-MG, após a venda de Victor para o próprio time de Belo Horizonte, Grohe passou a ouvir inúmeros comentários de amigos e familiares sobre a demolição do estádio, que só deve ocorrer após o mês de março, quando a OAS, construtora responsável pela Arena, receberá o terreno no bairro Azenha.
- Eles me perguntam se tenho a noção de que posso ficar na história do Olímpico. Não consigo imaginar que, futuramente, vou passar por aqui e não enxergar o estádio.
As conversas acontecem também com os ex-companheiros de clube. Na última semana, falou ao telefone com Tcheco, atual auxiliar técnico do Coritiba, com duas passagens pelo tricolor - entre 2006 e 2007 e 2008 e 2009.
- O Tcheco, que está vendo de fora a situação, está sentindo bastante. Os jogadores do elenco atual estão focados no Campeonato Brasileiro. Mas ele, que está no Coritiba, disse que até mesmo lá se comenta muito sobre o assunto.
Parado no pátio, em frente ao estádio, Marcelo Grohe consegue visualizar a despedida. Imagina torcedores emocionados, como ele, em dezembro. A partida derradeira deve ser o Gre-Nal de encerramento do Brasileirão, em 2 de dezembro.
- Já pensou no último jogo? Vão ter pessoas chorando aqui dentro. Gente que não vai querer deixar o estádio, que vai querer invadir o gramado.
Grohe espera que o futuro na Arena reserve para ele os bons frutos que o ano de despedida do Olímpico está rendendo. Ele já está sofrendo, inclusive, uma pequena pressão. Mas não é por causa do futebol. A mãe e a sogra do jogador querem ir ao primeiro jogo da nova casa.
- Eu disse para elas que, se ganhar ingresso, levo as duas.
Marcelo Grohe completaria 13 anos de Olímpico em março de 2013. Isso não será possível. Mas os corredores e o gramado da Arena, ainda em construção, já esperam pelo camisa 1.
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