Poucas vezes o presidente dos Comitês Olímpico Brasileiro e dos Jogos
Olímpicos e Paralímpicos Rio-2016, Carlos Arthur Nuzman, se desnudou
tanto em uma entrevista. Não fugiu de temas espinhosos e nem deixou de
conclamar para si a vitória da capital fluminense na luta pela sede
olímpica.
Com o aumento de recursos para o esporte nos últimos anos,
se dedica a outro tema: o desenvolvimento de instalações esportivas, o
caminho para o desenvolvimento. Sobre a delimitação do mandato de
dirigentes, um desabafo: "coisa de uma minoria insatisfeita".
LNET! - A preparação do Rio está atrasada?
Os
Jogos Olímpicos é o processo mais complexo do mundo e qualquer outro
evento é inferior. Com o trabalho que está se fazendo, estamos em dia.
Podem ter algumas situações que você seja obrigado a apressar e outras
não.
LNET! - E os pontos fortes e fracos da preparação?
A
integração entre os governos e comitê anda muito bem. Mas temos
situações de infraestrutura que poucas cidades que organizaram os Jogos
tiveram: a questão do transporte. Todos falavam sobre segurança, eu
dizia: atenção com o transporte. E o trabalho feito pelos governos
nessas áreas é extraordinário. As instalações esportivas, 47% delas
estão prontas. O Ministério da Justiça criou a Secretaria de Grandes
Eventos.
LNET! - Os pontos fracos?
Com toda a
franqueza, podemos até ter de recuperar o tempo em algumas obras, mas
não tem nada desesperador. Não tem nenhum problema grave. Existe um
conforto.
LNET! - Entre as obras que precisam ter o tempo recuperado estaria as instalações em Deodoro?
Deodoro,
talvez, tenha uma das instalações mais difíceis prontas, que é a de
tiro. Então, o que precisa ser feito são coisas mais simples e que
demandam menos tempo. Não tem atraso.
LNET! - Só que demandam tempo...
O
problema do tempo é que se precisa fazer os projetos executivos. Mas
estamos falando a quatro anos dos jogos. Por exemplo, se você quer falar
de tempo, vou dizer sempre que a maior dificuldade e o maior risco é a
Vila. E ela começou com tempo suficiente. O mesmo vale para as outras
obras. Porque também não adianta termos elas prontas muito antes, porque
significa despesas para o Comitê Organizador mantê-la. Não quero ter
instalações com tanta antecedência.
LNET! - Na semana
passada, o presidente do COI, Jacques Rogge, alertou o Brasil sobre a
necessidade de reformar os aeroportos. Já é um novo indício de que o COI
passará a ser mais ativo nas cobranças ao Brasil após Londres-2012?
Na
primeira avaliação feita do Rio, um dos pontos críticos eram os
aeroportos. Se você disser que este país tem uma unanimidade são os
problemas nos aeroportos. Isso não é novidade para ninguém. Então esse
tipo de comentário do presidente do COI é o que teremos de começar a
conviver com o andamento das obras e suas declarações mostram que é um
tópico fundamental.
LNET! - Em relação ao desempenho do
Brasil nos Jogos de Londres, o COB tem por meta repetir o ganho de 15
medalhas de Pequim-2008. Não é uma visão conservadora?
Não. Absolutamente realista Pensamos que pode ser mais ou até menos, mas perto de 15.
LNET! - Mas isso é um retrocesso.
O
problema é que você está vendo só o número de medalhas. É necessário
ver o número de finais que participamos. E nisso temos crescido e
melhorado a cada Olimpíada.
LNET! - Só que o número de recursos investidos no esporte tem aumentado substancialmente...
No
momento em que a União Soviética acabou, entraram 13 ou 14 países, que
pertenciam a ela, em condições de brigar por medalhas. Houve uma
pulverização enorme de países que hoje estão ganhando medalhas. As
condições dadas a outros continentes é muito grande. E esses outros
continentes passaram a ter atletas ganhadores de medalhas. Na natação,
por exemplo, tem vários atletas de países que não ganhavam medalhas, que
sequer antes tinham possibilidade. A China tem velocistas, o time de
basquete masculino da Nigéria acabou de se classificar em detrimento de
outros. O problema não é questão de dinheiro. Isso é uma bobagem.
LNET! - Então, precisa-se de dinheiro e estrutura? O modelo de desenvolvimento esportivo via universidades seria uma solução?
O
Rio é a única cidade da história do Jogos que ganhou a sede sem ter um
Centro Olímpico de Treinamento. Logo, se você descobre o talento, não
tem para onde levar. Temos os clubes, escolas e universidades. Mas tem
problemas. Para a ginástica, por exemplo, não adianta ir buscar nas
universidades porque se começa desde cedo. Por isso, as Olimpíadas
Escolares e Universitárias passaram a ser importante na revelação de
atletas, mas isso tem de ser feito dentro de um conjunto de formação.
Mas não só isso.
LNET! - O que mais é necessário?
O
clube também existe e é importante. Não achamos que o modelo americano é
o caminho, porque, lá, é pago. O atleta vai para a universidade
ganhando dinheiro. É como se fosse no clube. Temos um modelo altamente
elogiado pelo COI. O que precisamos é que os frutos dele possam ser
desenvolvidos.
LNET! - Aliás, o que o senhor acha do
projeto que tramita na Câmara dos Deputados para a limitação do mandato
de dirigentes à frente de entidades esportivas que recebam dinheiro do
governo federal?
Essa medida não representa a realidade que é
o esporte no mundo. Não representa aquilo que um dirigente só pode
fazer quando tem rodagem, anos de dedicação. Não serei ingênuo e dizer
que fui o presidente de um comitê organizador que ganhou os Jogos
Olímpicos só pelo projeto. Ganhou porque tenho tempo, conheço as pessoas
e as pessoas acreditam no meu trabalho. Não vamos nos iludir sobre
isso. Agora, tem gente que defende isso e às vezes não completa o
mandato porque tem dívidas, outros não ficam porque têm problemas.
LNET! - Quem poderia debater o assunto? O projeto é constitucional?
Temos
de respeitar as manifestações das assembleias das entidades esportivas.
Se o esporte for bem ou for mal, a culpa é da comunidade. Vou dar o
exemplo do meu esporte, o vôlei. Teve até hoje quatro presidentes. O
fundador, meu antecessor e peguei o vôlei em 15º do mundo e o entreguei
campeão olímpico, mundial, líder em todas as categorias e com dinheiro
em caixa. Fiquei, lá, por 21 anos. O Ary Graça assumiu e continuou o
trabalho. Vai ser presidente da Federação Internacional. Será que
estamos errados? E quanto ao projeto existe uma questão constitucional.
LNET! - Mas não é hora de mudar?
A
maioria dos dirigentes no mundo não tem limitação. Isso é da vida de
cada um, das comunidades. A imprensa tem todo o direito a criticar-nos.
Ela acompanha, vê os resultados. Mas, daqui a pouco, vão dizer que os
técnicos não podem ficar muito tempo no comando das equipes. E está aí, o
voleibol, com os dois melhores técnicos do mundo e que entraram na
minha administração. Não é só o resultado, mas o desenvolvimento do
esporte. Quando assumi a CBV, quem poderia dizer que o vôlei seria o
esporte número dois do Brasil? Ninguém! E em pouco tempo chegou lá.
Então, quer se limitar, quer se tirar, porque um grupo pequeno defende
isso? Aliás, uma minoria insatisfeita.
Fonte-Lancenet
Juliano.Gouveia
domingo, 22 de julho de 2012
'Problema não é dinheiro. Isso é bobagem', diz Nuzman
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