domingo, 22 de julho de 2012

'Problema não é dinheiro. Isso é bobagem', diz Nuzman

Nuzman (Foto: Alexandre Loureiro)Poucas vezes o presidente dos Comitês Olímpico Brasileiro e dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio-2016, Carlos Arthur Nuzman, se desnudou tanto em uma entrevista. Não fugiu de temas espinhosos e nem deixou de conclamar para si a vitória da capital fluminense na luta pela sede olímpica.
Com o aumento de recursos para o esporte nos últimos anos, se dedica a outro tema: o desenvolvimento de instalações esportivas, o caminho para o desenvolvimento. Sobre a delimitação do mandato de dirigentes, um desabafo: "coisa de uma minoria insatisfeita".

LNET! - A preparação do Rio está atrasada?

Os Jogos Olímpicos é o processo mais complexo do mundo e qualquer outro evento é inferior. Com o trabalho que está se fazendo, estamos em dia. Podem ter algumas situações que você seja obrigado a apressar e outras não.

LNET! - E os pontos fortes e fracos da preparação?

A integração entre os governos e comitê anda muito bem. Mas temos situações de infraestrutura que poucas cidades que organizaram os Jogos tiveram: a questão do transporte. Todos falavam sobre segurança, eu dizia: atenção com o transporte. E o trabalho feito pelos governos nessas áreas é extraordinário. As instalações esportivas, 47% delas estão prontas. O Ministério da Justiça criou a Secretaria de Grandes Eventos.

LNET! - Os pontos fracos?

Com toda a franqueza, podemos até ter de recuperar o tempo em algumas obras, mas não tem nada desesperador. Não tem nenhum problema grave. Existe um conforto.

LNET! - Entre as obras que precisam ter o tempo recuperado estaria as instalações em Deodoro?

Deodoro, talvez, tenha uma das instalações mais difíceis prontas, que é a de tiro. Então, o que precisa ser feito são coisas mais simples e que demandam menos tempo. Não tem atraso.

LNET! - Só que demandam tempo...

O problema do tempo é que se precisa fazer os projetos executivos. Mas estamos falando a quatro anos dos jogos. Por exemplo, se você quer falar de tempo, vou dizer sempre que a maior dificuldade e o maior risco é a Vila. E ela começou com tempo suficiente. O mesmo vale para as outras obras. Porque também não adianta termos elas prontas muito antes, porque significa despesas para o Comitê Organizador mantê-la. Não quero ter instalações com tanta antecedência.

LNET! - Na semana passada, o presidente do COI, Jacques Rogge, alertou o Brasil sobre a necessidade de reformar os aeroportos. Já é um novo indício de que o COI passará a ser mais ativo nas cobranças ao Brasil após Londres-2012?

Na primeira avaliação feita do Rio, um dos pontos críticos eram os aeroportos. Se você disser que este país tem uma unanimidade são os problemas nos aeroportos. Isso não é novidade para ninguém. Então esse tipo de comentário do presidente do COI é o que teremos de começar a conviver com o andamento das obras e suas declarações mostram que é um tópico fundamental.

LNET! - Em relação ao desempenho do Brasil nos Jogos de Londres, o COB tem por meta repetir o ganho de 15 medalhas de Pequim-2008. Não é uma visão conservadora?

Não. Absolutamente realista Pensamos que pode ser mais ou até menos, mas perto de 15.

LNET! - Mas isso é um retrocesso.

O problema é que você está vendo só o número de medalhas. É necessário ver o número de finais que participamos. E nisso temos crescido e melhorado a cada Olimpíada.

LNET! - Só que o número de recursos investidos no esporte tem aumentado substancialmente...

No momento em que a União Soviética acabou, entraram 13 ou 14 países, que pertenciam a ela, em condições de brigar por medalhas. Houve uma pulverização enorme de países que hoje estão ganhando medalhas. As condições dadas a outros continentes é muito grande. E esses outros continentes passaram a ter atletas ganhadores de medalhas. Na natação, por exemplo, tem vários atletas de países que não ganhavam medalhas, que sequer antes tinham possibilidade. A China tem velocistas, o time de basquete masculino da Nigéria acabou de se classificar em detrimento de outros. O problema não é questão de dinheiro. Isso é uma bobagem.

LNET! - Então, precisa-se de dinheiro e estrutura? O modelo de desenvolvimento esportivo via universidades seria uma solução?

O Rio é a única cidade da história do Jogos que ganhou a sede sem ter um Centro Olímpico de Treinamento. Logo, se você descobre o talento, não tem para onde levar. Temos os clubes, escolas e universidades. Mas tem problemas. Para a ginástica, por exemplo, não adianta ir buscar nas universidades porque se começa desde cedo. Por isso, as Olimpíadas Escolares e Universitárias passaram a ser importante na revelação de atletas, mas isso tem de ser feito dentro de um conjunto de formação. Mas não só isso.

LNET! - O que mais é necessário?

O clube também existe e é importante. Não achamos que o modelo americano é o caminho, porque, lá, é pago. O atleta vai para a universidade ganhando dinheiro. É como se fosse no clube. Temos um modelo altamente elogiado pelo COI. O que precisamos é que os frutos dele possam ser desenvolvidos.

LNET! - Aliás, o que o senhor acha do projeto que tramita na Câmara dos Deputados para a limitação do mandato de dirigentes à frente de entidades esportivas que recebam dinheiro do governo federal?

Essa medida não representa a realidade que é o esporte no mundo. Não representa aquilo que um dirigente só pode fazer quando tem rodagem, anos de dedicação. Não serei ingênuo e dizer que fui o presidente de um comitê organizador que ganhou os Jogos Olímpicos só pelo projeto. Ganhou porque tenho tempo, conheço as pessoas e as pessoas acreditam no meu trabalho. Não vamos nos iludir sobre isso. Agora, tem gente que defende isso e às vezes não completa o mandato porque tem dívidas, outros não ficam porque têm problemas.

LNET! - Quem poderia debater o assunto? O projeto é constitucional?
Temos de respeitar as manifestações das assembleias das entidades esportivas. Se o esporte for bem ou for mal, a culpa é da comunidade. Vou dar o exemplo do meu esporte, o vôlei. Teve até hoje quatro presidentes. O fundador, meu antecessor e peguei o vôlei em 15º do mundo e o entreguei campeão olímpico, mundial, líder em todas as categorias e com dinheiro em caixa. Fiquei, lá, por 21 anos. O Ary Graça assumiu e continuou o trabalho. Vai ser presidente da Federação Internacional. Será que estamos errados? E quanto ao projeto existe uma questão constitucional.

LNET! - Mas não é hora de mudar?

A maioria dos dirigentes no mundo não tem limitação. Isso é da vida de cada um, das comunidades. A imprensa tem todo o direito a criticar-nos. Ela acompanha, vê os resultados. Mas, daqui a pouco, vão dizer que os técnicos não podem ficar muito tempo no comando das equipes. E está aí, o voleibol, com os dois melhores técnicos do mundo e que entraram na minha administração. Não é só o resultado, mas o desenvolvimento do esporte. Quando assumi a CBV, quem poderia dizer que o vôlei seria o esporte número dois do Brasil? Ninguém! E em pouco tempo chegou lá. Então, quer se limitar, quer se tirar, porque um grupo pequeno defende isso? Aliás, uma minoria insatisfeita.

Fonte-Lancenet

Juliano.Gouveia

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